TORCEDOR, TÉCNICO E ELEITOR
“Tenho fases, como a lua.
Fases de andar escondida,
Fases de vir para a rua…”
Cecília Meireles, poema Lua Adversa
Houve uma época em que éramos, quase todos, técnicos da Seleção Brasileira de
futebol. Escalávamos o time e dávamos pitacos sobre estratégia, substituição,
arbitragem, enfim, sobre tudo. Do conforto das nossas poltronas, dirigíamos o jogo,
especialmente na Copa do Mundo. E com uma vantagem: se o time ganhasse, nos
sentíamos campeões; se perdesse, a culpa, claro, era do técnico oficial.
É mais ou menos o que está ocorrendo na atual campanha presidencial. Na ânsia,
quase desespero, de ganhar do fascismo e da barbárie, viramos todos marqueteiros do
Lula. E damos palpites sobre tudo: qual linha deve ser adotada nos programas, quais
alianças políticas nós concordamos, qual a cor ideal para as propagandas – se
resgatamos ou não o verde e o amarelo -, se devemos rir ou chorar com o tal Janones
nas redes sociais e por aí vamos.
Mas o chique é dar opinião sobre os debates. Aí é como comandar a Seleção Brasileira
na final da Copa. O nervosismo toma conta e nos permitimos criar respostas para
perguntas idiotas ou agressivas, imaginar estratégia de questionamentos que
constranjam os adversários e, como em um gol, vibrar quando o candidato do outro lado
dá uma escorregada misógina, por sinal uma característica dele.
E esse envolvimento tão forte, cada um participando como pode, ressalta bem o
momento pelo qual passam o país e o povo brasileiro. Estamos em uma campanha
diferente por sabermos que ela define se sairemos rumo ao resgate do Estado
democrático de direito, ou se nós nos afundaremos na escalada golpista e de desastre
para o Brasil. Um país abandonado com a volta da fome de forma avassaladora e com
o sucateamento da cultura, da saúde e da educação.
Mas todo o empenho nestas eleições tem como pano de fundo a certeza que dela sairá
um Brasil que terá feito a opção entre o Estado democrático de direito e a civilização,
ou a insegurança golpista e a barbárie. Com o sucateamento da cultura, da educação e
da saúde, com a implementação de práticas fascistas por parte do governo Bolsonaro
e, principalmente, com a volta da fome para 33 milhões de brasileiros, essa eleição
poderá sim ser a última.
Nenhum país suporta mais de 4 anos de aniquilamento em todos os setores. Nossa
institucionalidade está por um fio. As tentativas múltiplas de ruptura por parte dos
bolsonaristas encontrarão campo fértil se o povo nas urnas optar pelo fascismo.
Por isso mesmo, recorro-me a Cervantes, na voz de Dom Quixote, ao dizer para seu fiel
escudeiro: “A liberdade, Sancho, é um dos dons mais preciosos, que aos homens deram
os céus: não se lhe podem igualar os tesouros que há na terra, nem os que o mar
encobre; pela liberdade, da mesma forma que pela honra, se deve arriscar a vida, e,
pelo contrário, o cativeiro é o maior mal que pode acudir aos homens.”
Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay