GUERRAS: VALE TUDO POR DINHEIRO

“Tem mais presença em mim o que me falta.”
Manoel de Barros
Em 2011, fui convidado pelo rei Roberto Carlos para acompanhá-lo em um
show em Israel. A apresentação – que ocorreu em um palco de pouco mais de mil metros
quadrados no local conhecido como “Piscina do Sultão”, próximo ao Monte Sião e junto
às Muralhas da Cidade Velha de Jerusalém – foi linda e emocionante. Roberto cantou
em hebraico, inglês, italiano, espanhol e português. Foi criado um ambiente de muita
emoção e a paisagem era belíssima. Dirigido por Jayme Monjardim e apresentado por
Glória Maria, o clima foi completamente de paz e harmonia. Um coral de 30 brasileiros
que viviam em Israel cantou “Jerusalém de Ouro” e “Jesus Cristo”. Só havia espaço para
entoar o amor. Depois do espetáculo, andamos pela cidade, à noite, em segurança.
Algo me marcou especialmente em terras palestinas e israelenses. Fui visitar a cidade
palestina de Belém, encrustada no meio da região central da Cisjordânia, situada a 10
km ao sul de Jerusalém e a 60 quilômetros da Faixa de Gaza. Fomos em uma van de
turismo e a guia era judia. No caminho, ela explicou todo o processo de passar pela
área fortemente protegida que cercava a cidade, da necessidade de apresentar o
passaporte no posto de controle israelense. Contou sobre as restrições para os judeus
entrarem em Belém. E, durante todo o tempo, ela foi falando, por telefone, com uma
outra guia, palestina, que assumiria o grupo quando passássemos para o lado palestino.
E aí veio a surpresa: a senhora disse que fazia aquele trabalho há anos, quase
diariamente, que conversava todo dia com a guia palestina, mas que nunca tinha se
encontrado com ela.
Quedei-me perplexo e resolvi convencê-las a se encontrarem. Os tempos eram de paz,
aparentemente. Depois de muita conversa, elas resolveram se ver. A guia israelense
desceu do ônibus, atravessou a “fronteira” junto ao posto de controle e abraçou a colega
palestina. Ambas choraram. Foi uma emoção que tomou conta de todos. Um sentimento
inexplicável. Sincero. Um abraço que, naquele momento, significava um respiro e uma
chance para a paz.
Lembrei-me desse episódio ao acompanhar hoje, perplexo, o desenrolar do genocídio
que Benjamin Netanyahu promove na Faixa de Gaza. Há alguns dias, até pelo
protagonismo de Donald Trump, que atacou o Irã, a grande mídia voltou toda sua
atenção para a questão EUA-ISRAEL-IRÃ. As informações desencontradas promovidas
pelo próprio Presidente norte-americano, algumas incompreensíveis, mudaram o foco
do genocídio diário. As informações são no sentido de que, enquanto isso, a política de
terra arrasada em Gaza recrudesceu. Se antes já era impossível saber a dimensão da
tragédia, neste momento, ao que parece, Netanyahu conseguiu passe livre para
exterminar o pouco que resta em Gaza. O genocídio continua, sem ser o principal
elemento de atenção da imprensa.
Na verdade, escrevo mais para registrar a completa perplexidade sobre o teatro que se
instalou depois que os EUA atacaram o Irã. Já existia um teatro, mas mudou o enredo.
O Presidente Trump assumiu o papel, não só de senhor do mundo, mas de explicador
geral das guerras. Como, claramente, ele não sabe o que está acontecendo, não tem
como saber, o mundo está acompanhando um pastelão.
Até então, a revolta era com a matança indiscriminada que continua e, provavelmente,
até recrudesceu, mas agora é, também, com um sentimento de que não é só o absurdo
das guerras, mas somos submetidos ao ridículo da prepotência de quem quer mostrar
que manda no mundo. O que interessa aos donos da ofensiva é que, segundo um
consultor financeiro do chefe do Estado-Maior das Forças de Defesa de Israel, a guerra
com o Irã custa, para Israel, cerca de US$ 750 milhões por dia. E os gastos dos EUA
com as operações militares de Israel e na região somaram, em apenas um ano, algo
em torno de, pelo menos, US$ 22,76 bilhões.
Um estudo conservador do “Cost of War”, projeto de pesquisa desenvolvido pela Brown
University sobre gastos militares, sem incluir várias categorias, aponta que, desde 1959,
apenas de ajuda militar dos EUA para Israel, a cifra foi de US$ 251,2 bilhões. Em 2024,
os EUA gastaram com o setor militar no mundo quase um trilhão de dólares. E isso,
claro, é apenas o que foi divulgado. Para se ter uma ideia, em 2022 o país reconheceu
um gasto de US$ 765,8 bilhões, mas estima-se que foram gastos US$ 1,537 trilhão de
dólares.
As empresas Lockheed Martin Corp., RTX, Northrop Grumman Corp., Boeing e tantas
outras agradecem. Dá pra entender porque o presidente dos EUA assumiu o papel de
animador da guerra.
“A vitória está reservada para aqueles que estão dispostos a pagar o preço.”
Sun Tzu – general, estrategista e filósofo chinês autor de A Arte da Guerra
Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay