O CRIME DA PONTE: ELES NÃO ESTÃO NEM AÍ

“Viver é um rasgar-se e remendar-se.”

Guimarães Rosa

Após a Operação Verão da Polícia Militar, o governador Tarcísio se manifestou, em 8 de março de 2024, sobre a agressividade da ação da polícia: “Pode ir na ONU que não tô nem aí”. Quando escolheu o seu secretário de Segurança Pública, o capitão e deputado federal Guilherme Derrite, o governador sabia que optava por alguém que também não estava nem aí para os abusos e para a violência policial. Ao contrário, apoiava e incentivava.

É conhecida a explicação do agora secretário de Segurança, quando ainda era tenente, sobre os motivos de ele ter sido transferido de unidade: “A real? Porque eu matei muito ladrão,” jactou-se. E, em um apoio à violência policial – especialmente contra o pobre e o negro – quando já secretário, foi claro ao comentar uma ação violenta que terminou em morte por parte de policiais: “ninguém será afastado no caso da abordagem da Rota”. Tem até sigla para essas mortes sem punição: MDIP – Morte Decorrente de Intervenção Policial.

Em março de 2019, o então Presidente Bolsonaro, ao comentar a Lei de abuso de autoridade, afirmou: “é um absurdo a condenação de policiais por excesso em serviço”. E, quando pôde, tratou de indultar policiais condenados por ações violentas.  Ou seja, o incentivo à violência policial é um orgulho para a extrema-direita. É mote de campanha a promessa de matar “bandidos” e o que implementam durante o governo nada mais é do que o cumprimento dessas promessas. Essa postura agressiva e arbitrária só existe porque tem o apoio de boa parte da população, traz voto. Os que têm a coragem de criticá-la abertamente são tachados de protetores de criminosos.

Recentemente, escrevi aqui o artigo: “Um ponto sem volta?”, em que demonstrei minha perplexidade pelo fato de amigos bolsonaristas terem criticado uma pessoa por ter ido ao show da Bethânia e Caetano, pois consideram a dupla um acinte aos valores da extrema direita, ou uma exaltação à liberdade e à leveza do ser. Hoje, penso que a reflexão deve ser sobre como chegamos a essa banalização e glamourização da violência. Quem somos nós, afinal? Que sociedade é essa que aplaude e é cúmplice da barbárie?

Nesta semana, estava lendo com a televisão ligada ao fundo, em horário nobre, e as cenas de 2 crimes covardes e chocantes invadiram a intimidade da minha casa e de todos os lares brasileiros.

Um policial militar deu 11 tiros nas costas de um homem de 26 anos, no Jardim Prudência, que havia furtado um sabão em um supermercado. Uma morte com uma violência gratuita de quem sabe ter a impunidade e o apoio de boa parte da população. Na matéria seguinte, a cena inacreditável de um policial militar jogando um cidadão brasileiro de uma ponte de 3 metros de altura. A imagem causa indignação e perplexidade. E, tão grave quanto, pelo menos 4 policiais do 24º Batalhão da PM ainda impedem o socorro à pessoa.

Há pouco mais de uma semana, um policial militar matou, com um tiro à queima-roupa, em um hotel na Vila Mariana em São Paulo, um estudante de medicina de 22 anos. Marco Aurélio Cardenas foi assassinado como produto da política de violência que a sociedade apoia e que a extrema direita gosta de implementar. Ou nos indignamos e mudamos essa rota de violência, ou continuaremos a ser tragados por ela no dia a dia. Todos cúmplices, afinal.

Como falou Ferreira Gullar: “Uma parte de mim é todo mundo: outra parte é ninguém: fundo sem fundo”.

Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay

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