SISTEMA CARCERÁRIO E A CONTRIBUIÇÃO DA EXTREMA DIREITA
“Quem pecou está perdido. Cristo perdoa, os homens não.”
Francesco Carnelutti
Em 18 de fevereiro, quando o Dr. Paulo Gonet ofereceu a denúncia contra o que chamou
de “grupo crucial” – composto por 8 golpistas e liderado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro
-, escrevi um artigo afirmando que o processo deveria ser julgado em setembro. Dos oito
denunciados, além do ex-presidente da República, estavam três generais, um excomandante da Marinha, um ex-ministro da Justiça e um deputado federal, além do
delator Mauro Cid, que é tenente-coronel.
Todos ocuparam papéis de destaque no desastrado e criminoso governo Bolsonaro. E
tiveram importância fundamental na trama golpista. Claro que o líder da organização
criminosa era o ex-presidente da República. Embora seja um indigente intelectual, com
pouquíssima capacidade de articulação, tendo muita dificuldade até mesmo para
conversar qualquer assunto mais elaborado, o fato de ter ocupado o cargo mais
poderoso do Brasil deu a ele a proeminência na condução da tentativa de golpe.
Setembro chegou rápido para os réus e, no dia 11 daquele mês, todos foram condenados
pelos 5 crimes apontados pelo procurador-geral da República. Com a publicação do
acórdão, em 22 de outubro, os condenados, exceto o delator Mauro Cid, apresentaram
embargos de declaração, o único recurso cabível.
Na verdade, tecnicamente, o que ocorrerá no julgamento dos embargos não é
propriamente um novo julgamento. Apenas a Primeira Turma do Supremo Tribunal irá
decidir se ocorreu alguma contradição, obscuridade ou omissão no acórdão. Certamente,
não haverá maior novidade e os embargos devem ser rejeitados. O ministro Flávio Dino,
presidente do colegiado, já marcou o julgamento para uma sessão virtual que ocorrerá
no período de 7 a 14 de novembro. A Corte não tem aceitado a oposição de segundos
embargos, salvo em situações excepcionais. Assim sendo, logo após o julgamento, a
Turma irá decretar o trânsito em julgado e os condenados na ação penal 2668 estarão
aptos a começarem a cumprir as penas.
Com o trânsito em julgado, os condenados serão recolhidos às penitenciárias. O expresidente Jair Bolsonaro irá para a Papuda. Em Brasília, o que se comenta é que uma
cela especial já está preparada à espera do golpista. Cada um já se organiza, a esta altura,
para ser preso em uma cadeia em seus estados de origem, até para facilitar a visita dos
familiares.
O péssimo sistema carcerário brasileiro, que nunca foi objeto de preocupação dos
golpistas de extrema direita, irá mostrar toda a miséria humana em cárceres que não
cumprem, minimamente, as condições dignas. É claro que estarão melhores instalados
do que a grande massa dos quase 800 mil presos que existem no Brasil. Mas conhecerão
a crueza de um sistema falido que o próprio Supremo Tribunal já considerou como estado
de coisas inconstitucional. Tradicionalmente, os políticos de extrema direita desdenham
das reclamações sobre a miserabilidade das cadeias. Vão agora sofrer com aquilo que
desprezavam.
O ex-presidente Bolsonaro já se prepara para um pedido de prisão domiciliar, alegando
problemas de saúde. Logo ele, o imorrível, o imbroxável. Mas, se ele conseguir uma
domiciliar, pode ser que a turma da direita radical tente, enfim, fazer algo razoável para
a questão dos direitos e garantias individuais e para os direitos humanos.
No dia em que sair a domiciliar, temos de fazer uma campanha nacional sobre a situação
carcerária dos quase 1 milhão de presos no Brasil. Exigir que tudo seja publicizado:
quantos detentos estão em condições para conseguir domiciliar? Quantos podem usar
tornozeleira eletrônica? Quantos já podem progredir de regime? Quantos já cumpriram
pena e ainda estão presos? E mais, vamos debater sobre as péssimas condições
carcerárias, a comida azeda, as revistas vexatórias e a superpopulação. Enfim, vamos
discutir uma vida digna para a população carcerária. Exatamente o que os bolsonaristas
sempre criticaram. Talvez, essa seja a maior contribuição desses fascistas para o Brasil.
Como nos ensinou Rainer Maria Rilke:
“Extinga a minha visão: eu ainda posso vê-lo.”
Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay
