OUTRA VEZ, O SUPREMO TRIBUNAL
“Toda opinião sua é insana;
Pois a que mais se recata
Se não vos admite, é ingrata,
Se vos admite é leviana.”
Poeta mexicana Juana Inés de La Cruz
Quando fiz uma rápida crítica do veto do Congresso Nacional ao decreto do Executivo
sobre o aumento da alíquota do IOF, de maneira inconstitucional, usando um decreto
Legislativo e entrando na competência exclusiva do Executivo, fiz questão de frisar que
o Congresso fez uma opção pelos ricos. É óbvio que o IOF afeta toda a cadeia de
produção e repercute diretamente no consumidor final, e mesmo na competitividade da
produção brasileira mundo afora. Os especialistas explicam que o IOF compõe o custo
dos produtos e serviços, bem como dos insumos e das despesas das empresas, e está
relacionado ao crédito, estando embutido em todos os carnês que acompanham o dia a
dia do consumidor, especialmente o mais pobre. Mas o que eu afirmei, e afirmo, é que
o Congresso, claramente, não derrubou o IOF pela repercussão do aumento para a
classe mais pobre. Foi uma decisão política que interessa aos donos do poder.
Parece sintomático que os congressistas falem da necessidade de cortar despesas –
voltando artilharia pesada contra Lula e Haddad – e, no mesmo dia, votem para
aumentar o número de deputados federais. E, com certa candura, defendem que não
haverá ônus para o Estado esse incremento. A incoerência é a marca dessa postura. A
repercussão do acréscimo de deputados extrapola as despesas que teremos que arcar.
Sim, quem paga a conta somos todos nós, com a manutenção do salário dos 18 novos
parlamentares. O que está em jogo é uma opção política de esgarçamento do poder
político do governo Lula.
Nessa discussão, relevante observar que não abordaram a revisão dos princípios que
norteiam o número mínimo e máximo da representação de cada estado. Se fosse assim,
a opção, talvez, fosse cortar o número mínimo de deputados em algumas unidades
federativas. Porém, aumentaram 18 novos membros. Assim, por exemplo, Roraima é
super-representado e, com 0,3 da população nacional, mantém seus 8 deputados.
Mas, o que está efetivamente em jogo é a disputa de poder e a tentativa de enfraquecer
politicamente o governo Lula. É só observar a quadra política. A gestão Lula-Haddad
tem números que impressionam. Em praticamente todos os setores, a administração
está indo muito bem. O país cresce a um ritmo maior do que os demais, o desemprego
está no patamar mais baixo dos últimos anos e a fome teve decréscimo vertiginoso.
Porém, o que se vê são críticas e a popularidade do Presidente em forte queda.
Por isso, reitero que a questão é política. Enquanto escrevo este artigo, leio que o Lula
resolveu “bater às portas” do STF para questionar a derrubada do decreto sobre o IOF.
É uma decisão política que vai, de alguma maneira, expor a Corte Suprema. O Tribunal
deve afirmar a inconstitucionalidade e o Congresso vai posar de indignado. Na verdade,
indignados deveríamos ficar ao constatar que o Legislativo invade a competência
privativa do Executivo. E que, pela Constituição, resta ao Supremo Tribunal a última
palavra.
Tudo isso faz parte do jogo e o que se espera é maturidade por parte dos atores
políticos. Maturidade que deve ser colocada à prova quando o inquérito das emendas
avançar sob a relatoria do ministro Flávio Dino. Talvez aí esteja a verdadeira
insatisfação de boa parte do Congresso Nacional. Outra vez, os holofotes estarão
voltados para o Judiciário. E não será sobre constitucionalidade ou não a discussão. O
país inteiro aguarda. No Brasil, não se morre de tédio.
Lembrando-nos de Miguel Torga, em Penas do purgatório:
“Guarde a sua desgraça
Oh desgraçado.
Viva já sepultado
Noite e dia.
Sofra sem dizer nada,
Uma boa agonia
Deve ser lenta, lúgubre e calada.”
Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay