Silvio Almeida: O Brasil que importa

“Foi a democracia a grande vitoriosa nesta eleição, superando a maior mobilização de recursos públicos e privados que já se viu; as mais violentas ameaças à liberdade do voto, a mais abjeta campanha de mentiras e de ódio tramada para manipular e constranger o eleitorado.”

Discurso de posse do Presidente Lula, no Congresso Nacional, em 1º de janeiro de 2023

 

 

Em um mundo em que o controle da narrativa pode apontar os rumos que a sociedade vai tomar, são, como nunca, importantes os sinais passados para as pessoas. Durante quatro anos, um governo fascista sem escrúpulos se alimentou de mentiras e falsidades e fez do ódio e da violência os motes propulsores do seu método bárbaro de tratar a coisa pública, bem como o brasileiro. Sem nenhum pudor ético, houve um verdadeiro saque em diversas áreas. O país foi, praticamente, destruído nas suas bases civilizatórias. E tão grave quanto é o fato de que as mensagens que os bolsonaristas passavam eram desprovidas de qualquer compromisso com os pilares humanistas de uma sociedade democrática.

 

Tendo como exemplo a figura grotesca do Presidente da República, o governo foi ocupado por figuras sem nenhum cacoete de civilidade. Parecia um festival de bizarrices, no qual os ministros e secretários disputavam para ver quem seria mais escatológico. Daí surgiu, como um dos exemplos mais fortes, a Ministra dos Direitos Humanos, hoje Senadora eleita, Damares. Ou o presidente da Fundação Palmares, que tinha horror aos negros, e tantos outros. Um grupo enorme que se escondia em armários com seus preconceitos, suas sexualidades castradas, suas violências no trato de tudo que representa uma sociedade democrática. Esse é o retrato apagado pendurado em uma parede que sustentava a barbárie governamental.

 

Por tudo isso, a importância da posse do Lula e de seus Ministros toma uma relevância ainda maior. O ato do Presidente Lula de chamar pessoas representativas de uma sociedade que era invisível no governo anterior talvez seja o de maior simbolismo neste momento de resgatar a dignidade e a autoestima do brasileiro. Foi muito significativo ver o povo subir junto a rampa e colocar a faixa no Presidente Lula. É um reencontro do governo com a face humanitária da nossa nação que estava perdida.

A foto que rodou o mundo com a cachorrinha Resistência; o líder indígena Raoni Metuktire, cacique Kayapó; a catadora de resíduos para reciclagem Aline Souza; o menino nadador negro de 10 anos, Francisco; a pessoa com deficiência, que sofreu paralisia cerebral aos 3 anos e é referência na luta anticapacitista, Ivan Baron; o metalúrgico do ABC Weslley Rodrigues; o professor Murilo de Quadros Jesus; a cozinheira Jucimara Fausto dos Santos e o artesão Flávio Pereira subindo a rampa com o Presidente Lula ainda teve um efeito maior, pois dava a impressão que aquele mar de brasileiros que ocupavam a praça também estavam subindo a rampa. É o Brasil tomando as rédeas da sua história. Lembrando sempre de Cecília Meireles, “Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, não há ninguém que explique e ninguém que não entenda”.

 

E Brasília sentiu a mudança de ares com a chegada ao poder de pessoas efetivamente comprometidas com o combate às desigualdades e à fome. Talvez a indicação do Ministro Silvio Almeida para a pasta de Direitos Humanos seja a mais forte sinalização de que os tempos são outros, de que a preocupação com a dignidade do povo brasileiro será a principal tônica do governo Lula. O Ministro é um jurista, filósofo e professor, sendo um dos maiores intelectuais da geração dele. Em seu discurso, além de citar Luiz Gama, Carlos Drummond, Martin Luther King e um ditado iorubá, ele afirmou que iria dizer o óbvio e elencou uma lista de esquecidos do governo fascista.

 

E, ao dizer que será Ministro de um país que colocará a vida e a dignidade humana em primeiro lugar, tratou de explicitar que os trabalhadores e trabalhadoras, as mulheres, os pretos e pretas, os povos indígenas, as pessoas lésbicas, gays, bissexuais, transsexuais, travestis, intersexo e não binárias, as pessoas em situação de rua, as com deficiência, as idosas, os anistiados e os filhos de anistiados, as vítimas de violência, as vítimas da fome e da falta de moradia, as que sofrem com a falta de acesso à saúde, as empregadas domésticas, as pessoas que sofrem com a falta de transporte e todas e todos que têm seus direitos violados, todos esses existem e são valiosos para o Ministério e para o Governo. E ainda defendeu políticas contra a tortura, o racismo e a defesa da população LGBTQIA+. Ou seja, dar visibilidade aos invisíveis e perseguidos pelo fascismo.

 

Esses são os sinais que nos interessam passar para o Brasil e para o mundo. Agora é colocar em prática uma narrativa que nos faça ver que valeu a pena toda a nossa luta no combate ao fascismo e à crueldade desses bárbaros. A inclusão dos que foram solenemente esquecidos pelo governo anterior é o que justifica todo o nosso empenho. E não é uma tarefa tão somente do governo. Todos nós que fazemos parte de uma banda democrática e humanista da sociedade temos um papel a cumprir. Mesmo os que, como eu, fizeram a firme opção de jamais ocupar cargo público algum, mas com o compromisso de usar o direito à voz, que a militância democrática nos outorgou, mesmo nós temos a obrigação de lutar por um país mais justo, solidário e igual. Um Brasil que acolha a todos e não discrimine os menos favorecidos. Depende de cada um de nós. A hora é esta.

 

Sempre recorrendo a Clarice Lispector: “O que verdadeiramente somos é aquilo que o impossível cria em nós”.

 

 

Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay

Publicado no Poder 360.

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