Sérgio Moro chega, enfim, ao Supremo: como investigado…

 

“Arre, estou farto de semideuses!

Onde é que há gente no mundo?”

Fernando Pessoa, na pessoa de Álvaro de Campos, no Poema em linha reta

 

Temos que reconhecer que foi uma longa caminhada para o senador Sérgio Moro chegar ao Supremo Tribunal. Desde o início da operação Lava Jato, em 2014, para quem acompanhou de perto a postura de instrumentalização do Poder Judiciário pelo então juiz, que coordenava seus procuradores adestrados, começou a ficar evidente que o objetivo do grupo era político. A sede de poder foi aumentando de acordo com o forte apoio midiático. A turma era bem fraquinha em conhecimento específico de Direito, mas tinha uma excelente estrutura de marketing. Como são indigentes intelectuais e desprovidos de qualquer senso crítico, acreditavam que realmente eram super-heróis. Passaram a viver os personagens que foram sendo construídos pela grande mídia. E, cada vez mais, expunham-se ao ridículo, em atitudes messiânicas e pretensiosas. Entretanto, em um Brasil ávido por líderes, ainda que com pés de barro, eles ocuparam o imaginário popular. Dezenas de horas nos telejornais, rádios, capas de revistas, prêmios no exterior, primeiras páginas dos veículos de informação, enfim, toda a estrutura montada para assumirem o poder.

 

Como o projeto era verdadeiramente de assumirem o poder, a qualquer custo, não hesitaram em destruir parte das grandes empresas nacionais, em uma ousada estratégia entreguista. Foram responsáveis por milhões de desempregados e pela quebra de companhias que dominavam setores estratégicos da economia brasileira. Progressivamente, vem à tona o jogo afinado com interesses americanos, de empresas e do governo. Com um mote falso, como quase tudo na extrema direita, ficaram conhecidos como os combatentes da corrupção. Implacáveis. Usavam uma tese infantil, maniqueísta, mas que, com o apoio decisivo de grande parte da mídia, emplacou: quem tivesse coragem de denunciar os excessos da república de Curitiba era taxado como alguém que defende a corrupção. Primário. Porém eficiente.

 

Criaram um Código de Processo Penal próprio, não se envergonhavam de prender pessoas indefinidamente para conseguirem as delações. Distribuíam para a 13ª Vara Federal de Curitiba todos os processos que interessavam ao bando. Não existia para eles o princípio constitucional do juiz natural. Aliás, não respeitavam nenhuma regra de competência, a não ser as que servissem aos seus interesses políticos, financeiros e estratégicos. Como se despregaram da realidade, resolveram cometer os maiores abusos sem relevantes cuidados. Não leram Clarice Lispector: “Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso – nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro.”

 

Combinaram de prender o então candidato Lula, em primeiro lugar nas pesquisas, para favorecer o fascista Bolsonaro. Tornaram-se os principais eleitores do atraso e da barbárie. Mantiveram Lula preso por 580 dias, de maneira ilegal, inconstitucional e imoral. E o próprio juiz, em impensável desfaçatez, aceitou – em aparente caso clássico de corrupção – ser Ministro da Justiça do governo que ajudou a eleger. Até mesmo alguns procuradores se sentiram desconfortáveis com a jogada inescrupulosa. A ideia era ser candidato à Presidência da República depois de Bolsonaro, ou ser Ministro do Supremo Tribunal Federal. Depois, entraram em choque frontal com o monstro que criaram, numa disputa sangrenta de divisão de poder. Esse imbróglio resultou na eleição do ex-juiz para o cargo de Senador da República.

 

Agora, começa a ruir o mundo de fantasia que criaram. O Deltan já foi cassado e agora posa até de jornalista. E o senador Sérgio Moro deve ter seu mandato cassado até, provavelmente, fevereiro. Por ironia do destino, existe uma forte hipótese de o chefe da República de Curitiba ser cassado pelo Tribunal Regional do Paraná. Depois, será só o Tribunal Superior Eleitoral confirmar. Como cidadão, acompanho os movimentos desesperados do ainda senador para manter o mandato. Mal sabe ele, ignorante e pretensioso que é, que seria muito melhor ele ser cassado. É humilhante e constrangedor ser cassado como senador, mas daria a ele uma sobrevida em liberdade. O inquérito aberto no Supremo Tribunal Federal investiga uma série de graves crimes. O parlamentar atualmente tem direito ao foro privilegiado na Suprema Corte, um Tribunal que conta com uma grande quantidade de Ministros que o desprezam. Que sabem o que ele fez nos verões passados. Há murmúrios de outros inquéritos. Uma denúncia no Supremo Tribunal Federal, com a cobrança da mídia que já o abandonou, será julgada muito rapidamente e, penso, a condenação será inexorável. Daí para o cárcere, sem recurso para instância superior – salvo para o Bispo -, é um pequeno passo.

 

Caso seja cassado, o processo irá para a primeira instância, com direito a todos os recursos a serem utilizados pela regra constitucional da ampla defesa. E, sempre é bom lembrar, a ADC 43, da qual fui signatário e que cuidou da presunção de inocência, derrubou a prisão após a condenação em segundo grau. Segundo dizem os amigos do ainda senador, ele fala que aquela foi sua maior derrota. Foi o julgamento em questão que deu a liberdade ao Lula. E é ele que vai fazer com que os membros da República de Curitiba possam acompanhar todos os recursos em liberdade. Já me pediram para eu não dar esse conselho e deixar o infeliz continuar parlamentar, pois a prisão se dará antes. Mal sabem que essa turma de Curitiba não têm o hábito da leitura. Se quiserem manter segredo deles, é melhor escrever. Pelo menos a gente se diverte.

 

Remeto-me a Rui Barbosa: “De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto.”

 

Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay

 

Artigo publicado no Poder 360 no dia 26 de janeiro.

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